Este ano, resgatei alguns pirilampos de diferentes espécies da zona de Sintra, de Óbidos e da Ajuda, que estavam numa situação bastante difícil, a tentar atrair o/a parceiro/a, sem sucesso, debaixo de iluminação artificial!
Cheguei a ver aglomerações de fêmeas de Lampyris iberica debaixo de um candeeiro, numa pequena aldeia localizada nos arredores da Serra da Carregueira, e que apesar de ser um espetáculo muito belo, não deixa de ser uma indicação de que algo está errado ou que provavelmente existe um excesso (e desperdício) de luz artificial... Isto quando os machos, nas redondezas (em locais mais escuros) estavam plenamente ativos (confirmação feita através do uso de armadilhas luminosas).
Fêmeas adultas de Luciola lusitanica e de Lamprohiza paulinoi, também foram encontradas a brilhar debaixo de alguns candeeiros.
Demasiada luz para esta fêmea de Nyctophila reichii
Na Ajuda, encontrei fêmeas de Nyctophila reichii, a brilhar dentro de caixotes de lixo de um jardim (felizmente ainda vazios), talvez porque ali encontrassem um ambiente mais escuro e abrigado...
Mas algumas também foram encontradas em zonas «inundadas» de luz artificial.
Por sua vez, as armadilhas de luz confirmaram a ausência de machos no local e a sua presença em zonas próximas mais escuras.
E porque algumas fêmeas vão brilhar para estes sítios?
Porque as larvas das fêmeas procuram zonas ricas em caracóis, mas também com boa visibilidade, basicamente zonas abertas (para que os machos depois tenham mais facilidade em ver a sua luz desde grandes distâncias) e nesse processo algumas larvas são algo insensíveis à questão da luz artificial (pois as larvas têm um sistema visual pouco desenvolvido).
As larvas podem inclusivamente ser observadas a procurar minuciosamente, por um local adequado para se transformarem em pupa (e caso consigam lograr o acasalamento, desovar) durante várias noites e dias (expondo-se por vezes à luz do dia).
Larva de N. reichii à procura de um lugar para pupar
Quando finalmente encontram um sítio apropriado, iniciam a fase de pupa. Quando esta fase termina, as fêmeas adultas que emergem, neste caso, deparam-se de repente com um ambiente inóspito, e por vezes, tentam encontrar recantos escuros (umas mais, outras menos, pois algumas, tal como já referimos, são vistas a brilhar em zonas muito iluminadas por candeeiros).
Enquanto uma larva pode andar várias dezenas (ou se calhar até centenas) de metros, a fêmea adulta, por sua vez, normalmente só se move uns centimetros, a partir do momento em que finalmente acaba a fase de pupa, aspeto esse, que neste caso, a deixa bastante vulnerável.
Uma fêmea pode ser vista a brilhar durante várias noites praticamente no mesmo local...
Já as larvas, por vezes, são vistas a brilhar em locais bem distintos, mesmo passados poucos minutos.
Luz de uma larva de Lamprohiza sp. (Norte de Portugal)
Deslocar as fêmeas para as zonas de atividade dos machos, com raras exceções, é a meu ver impraticável, pois as fêmeas escolhem o seu local de desova praticamente ao centímetro (mas fazem-no quando são ainda larvas) e sem as adaptações apropriadas, ficariam assim expostas, desorientadas e passariam imenso tempo à procura novamente de um lugar para desovar. Com o desespero de quererem pôr ovos, poderiam ser levadas a pôr os ovos em locais pouco adequados.
Juntei portanto as fêmeas desorientadas com os machos locais e consegui obter ovos e larvas.
Os machos foram largados de novo na natureza, assim que a fecundação se considerou assegurada, pois assim podiam encontrar e cobrir outras fêmeas.
Fêmea de Lampyris iberica com ovos não fecundados
(João Luis Teixeira)
Posso dizer, que é um processo muito complicado a manutenção de pirilampos em cativeiro, sobretudo quando as larvas nascem e nos meses seguintes, porque têm poucos milímetros e são muito sensíveis a vários fatores.
São precisas horas, várias horas e muita paciência!
E até pode acontecer que machos e fêmeas, se recusem a acasalar, sem qualquer razão aparente...
Os pirilampos têm a reputação de ser quase impossíveis de manter em cativeiro, e eu acho que existe uma boa dose de verdade nisso.
Por alguma razão, estas espécies sensíveis, são muitas vezes usadas como biondicadores.
Mas antes de tomar a decisão de intervir, contactei o ICNF, do qual felizmente obtive autorização para manter estas espécies de pirilampo em cativeiro (desde que não as capturasse em zonas com algum estatuto de proteção).
Larvas de Lampyris iberica que serão soltas na zona de Sintra
Contudo, as larvas apenas serão mantidas em cativeiro temporariamente, pois tenciono soltar as larvas, processo que já foi iniciado este Outono em Óbidos e que entretanto vai-se estender naturalmente a Sintra e à Ajuda.
As zonas de solta, apresentam um habitat mais propício para estas espécies (do que os locais onde foram encontradas as fêmeas adultas) e algumas variedades locais de árvores autótones, serão semeadas também nestas 3 zonas.
A ajudar o projeto Lightalive na ação ecológica, que irá decorrer em Fevereiro e Maio de 2020, estará um grupo de crianças e respetivos encarregados de educação (que depois será apresentada neste blog).
Mais fotos de larvas de pirilampo resultantes deste resgate:
Larvas de Nyctophila reichii
Larvas de Lampyris iberica
Diferença de tamanho entre larvas «irmãs»
Larvas de Nyctophila reichii
Uma das primeiras libertações (zona de Óbidos)
Larvas de Lamprohiza paulinoi após a primeira muda
Larvas de Luciola lusitanica após a primeira muda
Larvas de Lampyris iberica
Larvas de Luciola lusitanica (Óbidos)
Larvas de Luciola lusitanica pouco antes de ser soltas.
Locais onde foram encontrados pirilampos a brilhar debaixo de candeeiros de iluminação pública (primeiro local de intervenção (arredores da Serra da Carregueira)):
Terceira zona de intervenção (arredores de Óbidos):